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Vinho, microbiota e coração

26 Fevereiro 2023

Um novo estudo, envolvendo pesquisadores brasileiros, aponta que o vinho pode modular a microbiota intestinal, potencialmente favorecendo a redução do estresse oxidativo.

Ainda que estudos  indiquem que o vinho possa apresentar um papel cardioprotetor, é sempre importante salientar que nenhuma bebida alcoólica deve ser utilizada como remédio. Segundo a OMS, o consumo nocivo de álcool é fator de risco para mais de 200 tipos de doenças e agravos, sendo que algumas destas doenças são referentes ao coração.  

Tendo estas considerações em vista, é papel da pesquisa científica continuar a estudar a relação entre álcool e saúde, sendo que muitas vezes são encontrados resultados inesperados, que não chegam a mudar a narrativa de que o consumo nocivo de álcool faz mal à saúde, mas sinalizam a complexidade do tema e a importância de estudá-lo. Este é o caso de um novo estudo, feito por pesquisadores da USP, UNICAMP, UnB e Harvard, analisando o efeito do consumo de baixas doses de vinho (250 mL) na microbiota intestinal de indivíduos com doença arterial coronariana. Mais especificamente, os autores da pesquisa estavam interessados em analisar potenciais efeitos cardioprotetores do vinho, que seriam mediados pela promoção de uma diversidade da microbiota que é mais efetiva em combater o estresse oxidativo(1). 

A pesquisa envolveu 42 homens, com média de 60 anos de idade. A análise dos componentes da microbiota após a intervenção, contudo, foi feita em apenas 20 indivíduos, selecionados aleatoriamente. Cada um dos participantes da pesquisa passou por um período de 3 semanas em que consumiam 250 mL de vinho 5 dias por semana, e depois por 3 semanas de abstenção. A ordem de cada uma das etapas era dada aleatoriamente, e entre elas havia um período de “limpeza” (washout), em que os participantes não consumiam bebidas alcoólicas, comidas fermentadas, prebióticos e probióticos. 

Após a análise de resultados, os autores concluem que é possível existir um efeito cardioprotetor do vinho mediado pela microbiota intestinal, mas outras pesquisas precisam ser feitas para realmente atestar essa relação. Em termos de limitações do estudo, os autores apontam que tanto o pequeno tamanho de amostra quanto o fato de serem todos homens com média de 60 anos, limitam a extensão de qualquer conclusão ou recomendação para a população em geral. Além disso, alertam que a mensuração do consumo de álcool foi feita por relato dos participantes, e não houve coleta de nenhum indicador biológico que atestasse esse relato. Além disso, o estudo não controlou os fatores individuais relacionados a fatores de risco comportamentais, como tabagismo, atividade física e outros fatores que podem afetar a microbiota intestinal. Diante de todo este cenário, a validade “prática” deste estudo ainda é bastante questionável, muito embora a temática tenha mérito. Mais pesquisas são necessárias para entender a modulação que a microbiota pode exercer nos efeitos do álcool em diversos órgãos do corpo humano. 

De maneira geral, o CISA reitera que nenhuma bebida deve ser consumida como remédio ou iniciar o consumo de álcool almejando benefícios. Além disso, como apontamos em nosso relatório “Álcool e a Saúde dos Brasileiros – Panorama 2022”, doença cardíaca hipertensiva e doença cardíaca isquêmica estão entre os transtornos parcialmente atribuíveis ao álcool que mais causam óbitos no Brasil. Assim, a melhor forma de cuidar da saúde do coração é adquirir hábitos saudáveis em seu cotidiano. Uma boa alimentação aliada a prática de atividades físicas, abandonar o tabagismo e evitar o uso nocivo de álcool, além de realizar o check-up anual são importantes para prevenir doenças cardiovasculares.

 

Additional Info

  • Referências:

    Haas EA, Saad MJA, Santos A, Vitulo N, Lemos WJF, Martins AMA, et al. A red wine intervention does not modify plasma trimethylamine N-oxide but is associated with broad shifts in the plasma metabolome and gut microbiota composition. Am J Clin Nutr [Internet]. 2022 Dec 19 [cited 2023 Feb 7];116(6):1515–29. Available from: https://academic.oup.com/ajcn/article/116/6/1515/6751899

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