Uma das grandes mudanças decorrente do isolamento social foi a maior convivência entre pais e filhos. Essa proximidade parental e a falta de contato presencial com os amigos poderia afetar o consumo de álcool por adolescentes? Os resultados de uma pesquisa canadense podem ser o começo para o entendimento dessa questão.
Realizado via questionário online com mais de mil jovens entre 14 e 18 anos, o estudo1 investigou se durante a pandemia houve alteração na quantidade, frequência e contexto do uso de substâncias (álcool, cannabis e cigarro eletrônico). Um dado chamou a atenção: dentre os adolescentes que fizeram uso de substâncias, 42% afirmaram fazê-lo junto com seus pais.
“Alguns pais pensam que estão protegendo seus filhos do uso abusivo de álcool ao liberarem e aceitarem o consumo de bebidas dentro de casa. Pelo contrário, essa atitude permissiva contribui para uma experimentação precoce e prejudicial. Quanto mais cedo for o uso, maior o risco de dependência; por isso, nenhum consumo de álcool é aceitável antes dos 18 anos. Há riscos à saúde dos adolescentes em curto e longo prazo”, alerta Arthur Guerra, psiquiatra e presidente executivo do CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool.
Em relação ao uso específico de álcool, a pesquisa indicou que o percentual de jovens que o consumiram aumentou ligeiramente no período pré-COVID para o pós-COVID (de 28,6% para 30,1%). Essa substância passou a ser utilizada com mais frequência por eles (a média de dias de uso, nas 3 semanas avaliadas antes e após a COVID-19, foi de 0,76 para 0,96), embora em menor quantidade: o beber pesado episódico (BPE), um padrão nocivo de consumo que ocorre quando é feita uma grande ingestão de álcool em uma única ocasião, diminuiu de 15,7% para 9,8%.
A pesquisa também mostrou que adolescentes com maior receio de contrair COVID-19 e que apresentaram sintomas depressivos durante o isolamento foram significativamente mais propensos a envolver-se no uso solitário de substâncias, enquanto os de maior popularidade demonstraram maior tendência de uso junto com amigos, incluindo em eventos online.
“Apesar das incertezas e desafios do período, esse é o momento para os pais irem além da proximidade física. Estabelecer laços afetivos com seus filhos, estreitar o relacionamento, ampliar o diálogo para explicar de forma aberta e franca os efeitos e as consequências negativas do uso de álcool, combinar as regras e disciplinar quando necessário. É importante que estejam atentos à saúde emocional e mental de crianças e adolescentes, ofereçam ajuda e procurem orientação médica se necessário. E, especialmente com relação ao consumo de bebidas dentro de casa, não seja permissivo com os menores de 18 anos e sempre dê o exemplo: não beba abusivamente”, reforça Guerra.