O consumo nocivo de álcool, como o Beber Pesado Episódico (ou binge drinking) é um problema comum entre jovens adultos, e as intervenções atuais, como projetos terapêuticos individuais, intervenções breves e modificações das expectativas em relação ao uso de álcool, têm mostrado efeitos positivos, embora modestos. De maneira geral, pesquisas sobre as intervenções atuais indicam que há pouca mudança comportamental significativa a longo prazo.
Uma alternativa promissora é o modelo “Know Your Numbers” (KYN) - “Conheça Seus Números” em português -, usado com sucesso para modificar comportamentos de risco em campanhas relacionadas a doenças cardiovasculares, como a da American Heart Association. Nesse modelo, o fornecimento de feedback quantitativo, como níveis de colesterol, mostrou-se eficaz para aumentar a conscientização. Contudo, até o momento, nenhum estudo combinou o modelo KYN com biomarcadores de álcool (como o PEth - um biomarcador sanguíneo do consumo de álcool, chamado de fosfatidiletanol) e pontuações do AUDIT (“Teste de Identificação de Transtornos por Uso de Álcool”) para criar um indicador quantitativo de risco relacionado ao consumo de álcool.
Um estudo recente avaliou a viabilidade, a aceitabilidade e a eficácia preliminar de uma intervenção baseada no modelo KYN, realizada durante quatro semanas, para motivar jovens adultos a reduzirem níveis perigosos de consumo de álcool. A hipótese principal postulou a conscientização sobre os valores de AUDIT e níveis de PEth encorajaria mudanças positivas no comportamento. As metas incluíam avaliar estratégias de recrutamento e retenção, examinar o impacto da intervenção na motivação para mudanças e medir sua eficácia preliminar na redução do consumo de álcool. Além disso, o estudo buscou analisar a aceitabilidade da abordagem KYN por meio de grupos focais (sessões em que participantes discutem suas experiências com a intervenção para fornecer feedback qualitativo), que também ofereceram sugestões de melhorias.
Foram recrutados 94 jovens adultos com idades entre 18 e 30 anos que relataram binge drinking no último mês. Participantes com condições específicas, como tratamento psiquiátrico, histórico de dependência química, gravidez, IMC acima de 30 ou distúrbios convulsivos, foram excluídos. De maneira geral, a estratégia foi eficaz, com 82,26% dos indivíduos recrutados e 76,9% retidos após quatro semanas.
Durante a intervenção, os participantes receberam feedback personalizado baseado nos níveis de PEth e nas pontuações do AUDIT. Um subgrupo participou de sessões de reforço após duas semanas, e grupos focais foram realizados ao final para avaliar a experiência. A motivação para a mudança foi medida pela escala Alcohol Contemplation Ladder, que mostrou um aumento significativo de 62% (p < 0,001) entre o início e o fim da intervenção, mas, apesar disso, muitos participantes ainda demonstraram indecisão quanto à modificação de comportamentos. Houve também uma redução significativa nas pontuações do AUDIT, com 61% dos participantes reduzindo ao menos um ponto; além disso, a proporção de bebedores classificados como “baixo risco” aumentou de 18% para 33%. Entretanto, não houve mudanças significativas nos níveis médios de PEth, embora 38% dos participantes tenham reduzido seus níveis de consumo. Além disso, a frequência e a intensidade de episódios de binge drinking permaneceram inalteradas.
Os grupos focais identificaram três temas principais: satisfação com o modelo quantitativo, necessidade de mais informações sobre os riscos associados ao consumo de álcool e o desejo de maior compreensão sobre os níveis de PEth e sua relação com o comportamento - pode-se dizer que esses resultados destacam a aceitação do modelo KYN, que foi considerado viável e alcançou as metas de recrutamento e retenção. No entanto, os resultados objetivos, como redução no binge drinking e alterações nos biomarcadores, foram limitados. Fatores como a curta duração da intervenção, a sazonalidade e a dificuldade dos participantes em compreender os dados biométricos podem ter influenciado os resultados de acordo com o artigo.
Em conclusão, a abordagem KYN se mostrou promissora para aumentar a conscientização sobre o consumo de álcool entre jovens adultos. Vale ressaltar que intervenções mais longas e robustas são necessárias para alcançar maior impacto nos biomarcadores e na redução de binge drinking. Os autores do estudo recomendam a realização de estudos randomizados com duração de 6 a 8 semanas e o uso de tecnologias como aplicativos para rastreamento em tempo real, além da integração de estratégias comportamentais, como definição de metas e lembretes personalizados. Destacam também que a tradução de dados biométricos em ações práticas e acessíveis é essencial para aumentar a eficácia dessa abordagem no público jovem.