Estudos revelam os possíveis efeitos do medicamento para o tratamento de diabetes tipo 2 e o transtorno por uso de álcool. Atualmente, apenas três medicações são aprovadas para o tratamento da dependência de álcool: o dissulfiram, o acamprosato e a naltrexona (para saber mais, veja nosso texto “Existem medicamentos para o tratamento do alcoolismo?”). Novos tratamentos podem ser identificados ao estabelecer os mecanismos neurobiológicos que estão por trás do desenvolvimento do alcoolismo. O alcoolismo é uma condição multifacetada, com desafios significativos no tratamento, incluindo a ingestão de alta quantidade de álcool por período prolongado e episódios de recaída frequentes entre os que estão buscando parar de beber. Tanto o consumo de álcool quanto a recaída são, até certo ponto, impulsionados pelas propriedades recompensadoras do álcool, o que em humanos se correlaciona com um aumento da disponibilidade do neurotransmissor dopamina em uma região muito importante do circuito de recompensa cerebral, chamada de núcleo accumbens (NAc).1 O GLP-1 (peptídeo semelhante ao glucagon-1) é um hormônio gastrointestinal incretina importante no contexto do metabolismo da glicose e no tratamento da diabetes tipo 2. Este hormônio é liberado no intestino delgado após a ingestão de alimentos e estimula a liberação de insulina no pâncreas em resposta a um aumento da glicose sanguínea.2 Dentro dos análogos do GLP-1, a semaglutida (mais conhecida como OzempicⓇ) é aprovada pelo FDA (instituição norte-americana “Food and Drug Administration”) como tratamento para diabetes tipo 2 e obesidade. Uma série de experimentos envolvendo abordagens comportamentais, neuroquímicas e moleculares em ratos e camundongos foram realizados para investigar as lacunas de conhecimento em relação ao GLP-1 e seu impacto no alcoolismo. O achado principal do estudo em ratos foi o efeito de doses baixas de semaglutida na supressão aguda e dose-dependente do consumo de álcool. Supõe-se que, ao bloquear a atividade locomotora e a elevação de dopamina no NAc induzida pelo álcool, a semaglutida possa atenuar a recompensa do álcool.2 Outro estudo pré-clínico com ratos também demonstrou o papel do sistema GLP-1 como um potencial alvo farmacoterapêutico para o alcoolismo. Observou-se que ratos dependentes de álcool apresentaram uma redução no consumo de álcool quando submetidos a intervenções neste sistema. Além disso, sugere-se que o sistema GLP-1 pode influenciar a neurotransmissão gabaérgica.3 Isso é particularmente relevante, considerando que o álcool intensifica a função inibitória no cérebro, principalmente através do ácido gama-aminobutírico (GABA), o principal neurotransmissor inibitório no cérebro.4 Contudo, as limitações desses estudos incluem a dificuldade em generalizar diretamente os resultados para humanos, pois foram realizados em animais. A redução do consumo de álcool em modelos animais pode não capturar completamente os aspectos psicológicos, sociais e ambientais do alcoolismo em humanos. Além disso, os estudos não avaliaram os efeitos a longo prazo do tratamento com a semaglutida em animais e o desenvolvimento de tolerância ao medicamento. Em suma, embora os estudos atuais sobre semaglutida e outros análogos do GLP, como a liraglutina e exenatida, mostrem resultados promissores na redução do consumo de álcool e na modulação da neurotransmissão central, é importante enfatizar que essas descobertas ainda estão em estágios iniciais e foram realizadas em modelos animais, o que leva a necessidade de ensaios clínicos robustos para melhor compreensão desses resultados. Enquanto esses estudos abrem caminhos para novas terapias, eles também destacam a necessidade de pesquisa contínua e cuidadosa de soluções efetivas e abrangentes para o tratamento do alcoolismo.