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 O consumo de álcool entre mulheres tem aumentado significativamente nos últimos anos, tornando essencial entender como ele interage com o uso de anticoncepcionais orais.

Impacto do Álcool na Eficácia dos Anticoncepcionais Orais

Embora não existam estudos conclusivos de que o álcool reduza diretamente a eficácia dos anticoncepcionais orais, seu consumo excessivo pode comprometer sua efetividade de maneira indireta. A principal razão para isso ocorrer é que o álcool pode fazer a pessoa esquecer de tomar a pílula no horário correto. 

Outro fator relevante é o impacto do álcool em casos de vômito.1 Se uma pessoa ingerir grandes quantidades de álcool e vomitar dentro de duas horas após tomar a pílula anticoncepcional, a absorção do medicamento pelo organismo pode ser comprometida, reduzindo sua eficácia.

Além disso, o consumo excessivo de álcool, incluindo episódios de binge drinking (bebedeira intensa), está associado a um maior risco de complicações médicas, como a formação de coágulos sanguíneos nos pulmões ou nas pernas.2 Algumas mulheres já apresentam um risco aumentado de desenvolver coágulos devido ao uso de anticoncepcionais hormonais, e o consumo elevado de álcool pode potencializar esse risco.2,3

Importância da Escolha Contraceptiva e Orientação Médica

Embora o álcool não pareça comprometer diretamente a eficácia dos contraceptivos orais, seu consumo excessivo pode influenciar a adesão ao método e trazer riscos adicionais à saúde. Além da pílula, existem outros métodos contraceptivos que podem ser mais adequados para algumas mulheres, como o DIU hormonal, implantes e injeções contraceptivas, que não exigem administração diária e podem ser menos suscetíveis a falhas decorrentes do uso inconsistente.

Por isso, é essencial que cada mulher busque orientação médica para escolher o método contraceptivo mais adequado ao seu estilo de vida e histórico de saúde. Conversar com um profissional pode ajudar a esclarecer dúvidas sobre os possíveis impactos do álcool e garantir uma escolha contraceptiva segura e eficaz.


 

 

Pesquisa nacional revela perfil do consumo de álcool no Brasil: metade dos adultos bebe, e quase 1 em cada 5 admite exagerar na dose.

Uma pesquisa do Instituto Datafolha1, realizada em abril de 2025, revelou que 49% dos brasileiros com 18 anos ou mais costumam consumir bebidas alcoólicas. A maior porcentagem (20%) bebe de uma a duas vezes por semana, enquanto 3% disseram consumir álcool quase diariamente. Outros 13% relataram beber com menor frequência, uma vez por mês ou menos.

Homens (ainda) bebem mais — e com mais frequência

O levantamento apontou que o consumo ainda é mais prevalente entre os homens: 58% deles consomem bebidas alcoólicas, contra 42% das mulheres. Além disso, eles também bebem com mais frequência: 10% dos homens bebem de três a sete dias por semana, índice que cai para 2% entre as mulheres. 

Pesquisas mostram, no entanto, que a prevalência de mulheres que bebem vem aumentando ao longo dos anos. Dados do último relatório Álcool e a Saúde dos Brasileiros com base no Vigitel2 mostram que o consumo não abusivo de álcool por mulheres subiu de 16,5% para 22,8% entre 2010 e 2023. Já o padrão abusivo subiu de 10,5% para 15,2% no mesmo período. 

Idade, renda e religião influenciam o hábito

O consumo é mais prevalente entre os jovens de 18 a 34 anos, com 58% relatando o hábito. Esse percentual vai diminuindo com a idade: cai para 46% na faixa de 45 a 59 anos, e para 35% entre os maiores de 60. 

A renda também tem impacto. Entre os que ganham de 5 a 10 salários mínimos, o consumo chega a 64%, enquanto na faixa de até 2 salários mínimos, apenas 43% relatam consumir bebidas alcoólicas.

A religião aparece como outro fator relevante: 27% dos evangélicos consomem álcool, comparados a 58% dos católicos. 

A pesquisa do Ipec3, feita a pedido do CISA em 2023, também mostrou um cenário parecido: os jovens 18-34 anos são os que apresentam menor nível de abstenção (25% apenas não bebem) e maior frequência de consumo uma vez por semana ou a cada 15 dias (23%). Sobre a religião, esta pesquisa também mostrou resultados semelhantes, com 27% dos evangélicos afirmando consumir álcool, contra 50% de católicos. 

 

Jovens menores de idade também bebem

O estudo também investigou o comportamento de adolescentes de 16 e 17 anos, com dados tratados separadamente, e constatou que 27% deles já consomem bebidas alcoólicas. Esse dado é preocupante, pois a ingestão de álcool nessa fase da vida pode ter consequências danosas para o desenvolvimento dos adolescentes. 

Quem consome, consome quanto?

Entre os que costumam beber, a média registrada foi de 4,5 doses na semana anterior à pesquisa, considerando cada dose como um copo, lata, taça ou drinque. Vinte e três por cento  dos entrevistados afirmaram ter consumido mais de 6 doses no período considerado. 

Apesar disso, 81% dos consumidores dizem acreditar que bebem na medida certa, enquanto apenas 18% reconhecem que exageram, sendo que 11% dizem beber mais do que deveriam, e 7%, muito mais.

Queda no consumo: tendência ou percepção?

Quando perguntados sobre o padrão de consumo no último ano, 53% afirmaram que reduziram o consumo de álcool, 35% disseram que ele se manteve estável e apenas 12% relataram aumento.

Em contrapartida, a média de consumo permanece alta: 4,5 doses na semana anterior, o que já pode caracterizar o uso abusivo. Nesse sentido, duas coisas se evidenciam: a primeira, que boa parte da população ainda consome álcool em um padrão nocivo e, a segunda, o descompasso entre a percepção dos consumidores acerca do próprio consumo e as recomendações de saúde pública.  

A pesquisa do Ipec3, na mesma direção dos achados do Datafolha, revelou que, entre consumidores abusivos de álcool (que contabilizavam cerca de 17% da população à época da pesquisa), 75% acreditavam ser moderados, dos quais apenas 13% reconhecem que precisam mudar esse hábito.

Esses dados revelam que existe uma parcela importante de pessoas que abusam do álcool e ainda não percebem seu padrão de consumo como problemático, demonstrando a necessidade de políticas públicas que esclareçam sobre o consumo abusivo e seus danos.

Pesquisas sugerem que o estrogênio pode influenciar o consumo excessivo de álcool entre as mulheres. Um estudo publicado na Nature Communications mostra como esse hormônio afeta vias cerebrais, em camundongos do sexo feminino, ligadas à motivação e ao estresse, apontando para um possível mecanismo biológico que pode aumentar a vulnerabilidade feminina ao álcool.

 

O consumo excessivo de álcool entre as mulheres tem aumentado nos últimos anos. E apesar de o uso abusivo de álcool causar sérios danos à saúde de qualquer pessoa, o álcool impacta a saúde das mulheres de maneira significativa devido a diferenças biológicas e fisiológicas em relação aos homens. [Saiba mais em Álcool e a Saúde Feminina]

Alguns estudos têm mencionado que os fatores hormonais, como o estrogênio por exemplo, podem impulsionar comportamentos relacionados ao álcool1-3. Com base nisso, um estudo publicado na revista Nature Communications4 investigou como o estrogênio poderia regular o comportamento de consumo de álcool em fêmeas de camundongos e quais vias cerebrais e moleculares estariam envolvidas nesse processo.

Para investigar o papel do estrogênio no consumo excessivo de álcool nas fêmeas, os pesquisadores observaram o consumo de álcool ao longo do ciclo estral (semelhante ao ciclo menstrual em humanos) e aplicaram o protocolo Drinking in the Dark (DID), que simula episódios de bebedeira. Além disso, realizaram manipulações hormonais, administrando estrogênio e bloqueadores seletivos dos receptores estrogênicos alfa (ERα) associados à membrana, responsáveis por uma ação hormonal rápida e não-genômica. Por fim, usaram técnicas de eletrofisiologia para avaliar a atividade de neurônios CRF (corticotropina – peptídeo envolvido na resposta ao estresse) no núcleo da estria terminal (BNST), a fim de identificar como essa via hormonal influencia a excitação neuronal e o comportamento de busca por álcool.

Os resultados do estudo demonstraram que o estrogênio exerce influência direta e significativa sobre o comportamento de consumo excessivo de álcool nas fêmeas de camundongos. Foi observado que, durante as fases do ciclo estral em que os níveis de estrogênio estavam mais elevados, as fêmeas apresentaram um aumento marcante na ingestão de etanol, sugerindo uma relação entre os picos hormonais e a vulnerabilidade ao consumo compulsivo. Quando o estrogênio foi administrado de forma exógena, o consumo também aumentou, confirmando essa associação. Por outro lado, o bloqueio dos receptores estrogênicos ERα, reduziu esse comportamento. Além disso, o estrogênio aumentou a atividade de neurônios CRF na BNST, região do cérebro ligada ao estresse e à motivação, indicando que essa via hormonal contribui diretamente para o comportamento de busca por álcool.

 

Podemos aplicar estes achados às mulheres?

Embora os achados deste estudo em camundongos ofereçam pistas importantes sobre como o estrogênio pode influenciar o consumo excessivo de álcool em fêmeas, é preciso cautela ao aplicar essas conclusões diretamente às mulheres. 

Modelos animais são fundamentais para entender mecanismos biológicos, mas não refletem toda a complexidade das experiências humanas, que envolvem fatores sociais, emocionais e culturais, principalmente no que se refere ao consumo de álcool. Além disso, o estudo analisou apenas os efeitos agudos do estrogênio em uma região específica do cérebro, deixando em aberto como esse hormônio pode atuar em contextos de uso crônico ou em associação a outras variáveis humanas. 

Ainda assim, os resultados obtidos sugerem um possível mecanismo biológico que pode ajudar a explicar a maior vulnerabilidade das mulheres aos efeitos nocivos do álcool. Por isso, esses achados reforçam a necessidade de mais pesquisas com mulheres, que investiguem o papel dos hormônios sexuais na motivação para o consumo de álcool, ajudando no desenvolvimento de estratégias de prevenção e tratamento mais eficazes e sensíveis às diferenças de gênero.

 

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© CISA, Centro de Informações sobre Saúde e Álcool