A menopausa é a fase da vida da mulher marcada pelo fim natural da menstruação e da fertilidade, devido à queda dos níveis hormonais, especialmente do estrogênio. Evidências científicas recentes apontam que o consumo de álcool durante essa fase pode interferir em sintomas como ondas de calor, humor e saúde mental, além de acelerar a perda óssea e aumentar riscos cardiovasculares, como hipertensão e arritmias. O álcool também pode interferir nos efeitos da terapia hormonal, elevando os riscos de complicações, como câncer de mama, por exemplo. Descubra como o álcool pode impactar a saúde da mulher durante a menopausa.
Efeitos do álcool nos sintomas da menopausa
Ondas de calor (fogachos): Estudos observacionais apresentaram resultados mistos, alguns associam o consumo de álcool a mais fogachos, outros não encontram relação clara ou até sugerem menos fogachos com consumo leve/moderado.1 Em um estudo de coorte com mais de 4.000 mulheres coreanas na fase pré-menopáusica, aquelas que consumiam ≥20 g de álcool por dia (aproximadamente 2 ou mais doses padrão) apresentaram um risco 1,7 a 2,2 vezes maior de desenvolver fogachos e sudorese noturna moderada a grave, comparadas às abstêmias. Os autores concluíram que evitar o consumo de álcool pode ajudar a prevenir sintomas vasomotores em mulheres próximas da transição menopáusica.1
Humor e saúde mental: A menopausa é um período de maior vulnerabilidade a alterações de humor e depressão, e o consumo pesado de álcool tende a agravar esses sintomas. Beber em excesso está associado a piora da depressão e ansiedade, e mulheres menopausadas que bebem pesado têm risco substancialmente maior de depressão, chegando a ser 2 a 7 vezes mais propensas a desenvolver depressão do que homens com alcoolismo.2 A busca pelo álcool para lidar com estresse ou humor negativo pode aumentar durante a transição menopáusica, dada a ocorrência de sintomas psicológicos e estressores sociais nessa fase, reforçando a necessidade de cautela e suporte para mulheres que começam a beber mais para aliviar o mal-estar emocional.3
Sono: O consumo de álcool, especialmente à noite, pode comprometer a qualidade do sono, aspecto frequentemente afetado na menopausa. Estudos mostram que o álcool reduz a proporção de sono REM e aumenta despertares noturnos, exacerbando o cansaço diurno e o mal-estar emocional.4
Relação entre consumo de álcool e saúde óssea e cardiovascular durante a menopausa
Saúde óssea: Consumos leves a moderados parecem ter efeito neutro ou até ligeiramente benéfico sobre a densidade mineral óssea (DMO) de mulheres pós-menopáusicas. Uma meta-análise de 2022 (11 estudos, aproximadamente 47 mil indivíduos) mostrou que mulheres que bebem até 1–2 doses de álcool por dia apresentam DMO do quadril e da coluna superiormente à de abstêmias.5 Por outro lado, o consumo excessivo traz prejuízo significativo: o mesmo estudo de 2022 identificou que a partir de quase 3 doses diárias o risco de fratura osteoporótica cresce acentuadamente. Mulheres ingerindo 3 drinques/dia tiveram risco cerca de 33% maior de fratura de quadril (e quase 59% maior com 4 drinques/dia) em comparação às não consumidoras. Contudo, os resultados devem ser interpretados com cautela devido a limitações como possível viés de causalidade reversa, heterogeneidade entre os estudos incluídos (em termos de métodos de aferição da DMO e classificação do consumo de álcool), e potencial influência de fatores confundidores não controlados, como dieta, atividade física, uso de terapia hormonal e tabagismo.5
Saúde cardiovascular: Após a menopausa, o risco cardiovascular feminino aumenta (pela perda do estrogênio protetor), e o papel do álcool nessa condição tem sido muito investigado. O consenso atual de algumas entidades, como a American Heart Association,6 é que pequenas quantidades de álcool não trazem risco cardiovascular, mas doses maiores rapidamente eliminam qualquer benefício e passam a aumentar o risco de hipertensão, arritmias, AVC e miocardiopatia.
Impacto do álcool em terapias hormonais ou tratamentos para menopausa
O metabolismo hormonal e o álcool interagem de formas importantes na pós-menopausa. O álcool é conhecido por elevar os níveis circulantes de estrogênios endógenos. Estudos mostraram que mulheres pós-menopáusicas que consomem álcool exibem estradiol mais alto, devido ao aumento da aromatização periférica e redução do catabolismo do estrogênio no fígado.7 Essa ação pode potencializar os efeitos das terapias hormonais usadas na menopausa. De fato, uma revisão destacou que o consumo de álcool pode aumentar as concentrações de estradiol em mulheres que fazem terapia de reposição estrogênica. Esse aumento hormonal induzido pelo álcool levanta preocupação, pois pode atenuar a eficácia de tratamentos anti-hormonais (por exemplo, em sobreviventes de câncer de mama que tomam medicamentos para o tratamento como os inibidores de aromatase) e pode amplificar riscos associados à reposição hormonal, como o risco de câncer de mama.8 Mesmo em mulheres que não fazem terapia hormonal, o consumo regular de álcool já foi associado a aumento do risco de câncer de mama, possivelmente por elevação dos níveis de estrogênios circulantes e geração de metabólitos carcinogênicos.9
Há orientações para o consumo de álcool entre mulheres na menopausa?
Por fim, vale citar um achado recente interessante: o padrão de consumo moderado de álcool associou-se a um leve atraso na menopausa natural. Uma análise prospectiva de 2021 encontrou uma ligação fraca porém significativa entre consumo moderado de álcool (10–14,9 g/dia), especialmente de vinho branco, e menor risco de menopausa precoce (antecipação antes dos 45 anos).10 Mulheres que se enquadraram nessa categoria tiveram cerca de 19% menos risco de menopausa precoce em comparação com mulheres que não bebiam, ingestões mais altas de álcool não conferiram essa vantagem. Os autores interpretaram que resultados semelhantes já haviam sido observados em outros estudos sobre idade menopausal e álcool, sugerindo que doses baixas podem ter influência hormonal que retarde ligeiramente o esgotamento ovariano. Embora esse achado seja intrigante do ponto de vista biológico, não se trata de recomendação para beber, apenas mais um dado epidemiológico sobre a complexa relação entre álcool e transição menopausal.
Apesar de o consumo de álcool poder ter implicações importantes para a saúde na menopausa, ele frequentemente não é abordado em consultas com mulheres maduras, seja por suposição de abstinência ou por falta de triagem sistemática. No entanto, profissionais de saúde são orientados a não presumir abstinência nessa população e a utilizar instrumentos de rastreamento, como o questionário AUDIT, para identificar padrões de uso de risco. Promover diálogos abertos sobre o uso de álcool com mulheres nessa fase, informar de forma clara o que é considerado consumo moderado e seguro, no máximo 1 dose (10 g de álcool) por dia para mulheres, e esclarecer os limiares de consumo excessivo pode contribuir para melhores decisões sobre saúde e qualidade de vida durante a menopausa.