A dependência de álcool é uma doença e o termo "alcoólatra" carrega um tom pejorativo e é atrelado ao estigma social, o que, muitas vezes pode dificultar no reconhecimento do problema e na busca por ajuda.
Assista ao vídeo para entender!
Entenda as individualidades do tratamento por uso de álcool em relação a saúde da mulher.
Beber álcool é, sem dúvida, uma parte importante da cultura ocidental, sendo comum para festejar, para confortar, para socializar, para relaxar, e até para lidar com problemas. No entanto, seu uso nocivo está associado a diversos tipos de doenças e agravos, sendo responsável pela morte de milhares de pessoas anualmente.
Embora o consumo abusivo ainda seja bastante presente no Brasil, os dados mostram que o país vem acompanhando a tendência mundial de queda no consumo entre jovens. Isso significa que mais pessoas estão repensando sua relação com o álcool e decidindo reduzir ou parar de beber. Mas, para muitas delas, essa decisão não tem sido bem aceita por quem está próximo.
O sober shaming ou vergonha da sobriedade é o ato de causar vergonha ou constrangimento a alguém que decide não beber. Esse tema surgiu por volta do ano de 2021, por meio de uma campanha de uma ONG do Reino Unido chamada Alcohol Change UK, e ganhou força nos últimos anos, reforçada pela tendência mundial de queda do consumo de álcool entre a geração jovem.
A vergonha da sobriedade pode acontecer de forma sutil, quando alguém pergunta: “por que você não vai beber? ” Ou de forma mais direta, quando se acusa a pessoa de ser chata por não beber, por exemplo. O simples fato de ter que justificar por que não se quer beber já é um exemplo dessa pressão social. Isto pode fazer com que as pessoas evitem completamente situações que envolvam álcool ou se retirem para evitar consequências sociais negativas1.
O álcool é o lubrificante social mais utilizado pela humanidade. Ele desarma as defesas, torna as barreiras mais porosas e os filtros mais transparentes. Por isso, para muitas culturas, ele se tornou sinônimo de diversão e a diminuição do seu consumo acaba sendo frequentemente associada a tédio e aborrecimento. Desse modo, o sober shaming faz parte da crença, ainda hoje existente, de que não é possível divertir-se sem o álcool.
Os bebedores também podem sentir-se criticados quando alguém decide parar ou moderar na bebida. Uma pesquisa2 mostrou que os bebedores de álcool se sentem julgados sobre seu consumo pelos não bebedores. Como resultado, quem não bebe pode ser visto como uma ameaça durante eventos sociais.
No entanto, existe uma diferença entre a pressão que homens e mulheres sofrem em relação ao consumo de álcool. Os resultados da literatura mostram que os homens sofrem mais pressão para beber do que as mulheres e que, para estas, é mais fácil encontrar razões socialmente aceitas para não beber ou moderar3. Nos homens, o consumo de álcool está associado a características masculinas. Beber grandes quantidades de álcool mantendo o autocontrole é visto como sinal de virilidade. Já entre as mulheres, o consumo excessivo pode ser culturalmente visto como vergonhoso ou imoral, o que diminui a pressão para o consumo.
A estigmatização da sobriedade pode manifestar-se de diferentes formas, como associar a pessoa abstêmia a características negativas (“chato”, “careta”, “fraco”) ou produzindo o medo de sofrer consequências sociais (por exemplo, deixar de ser convidado para alguns programas). Na pior das hipóteses, o indivíduo que não bebe pode até ser excluído do seu grupo social1.
As pessoas podem não saber que estão praticando sober shaming, e muitas não o fazem de propósito, sendo intencionado como uma brincadeira. Mas, ainda assim, essa atitude pode ser muito prejudicial - especialmente em combinação com todas as mensagens que dizem que beber é "normal” e não beber não é.
Ao praticar sober shaming, estamos dizendo às pessoas que sua decisão de não beber não é válida, contribuindo para uma cultura que isola e marginaliza aqueles que não bebem. Essa prática pode ter um impacto negativo na saúde mental e emocional das pessoas. Em vez disso, podemos mostrar respeito e apoio por aqueles que tomaram essa decisão. O fim da vergonha da sobriedade pode contribuir para que mais pessoas façam escolhas saudáveis.
Estudo revela que o consumo de álcool durante um encontro sexual não afeta memória das mulheres.
Alguns sintomas do alcoolismo auxiliam no reconhecimento na doença e facilitam a oferta de ajuda para um tratamento adequado.
De forma geral, o etanol é conhecido por sua capacidade de matar bactérias e vírus, mas sua eficácia depende da concentração e do tempo de exposição. O etanol em concentrações entre 60% e 85% é eficaz na eliminação de uma ampla gama de micro-organismos, mas essa eficácia é limitada ao uso externo, como em desinfetantes para as mãos e superfícies.1
Recentemente, um vídeo nas redes sociais viralizou mostrando uma mulher tomando um shot de álcool para “prevenir” uma possível intoxicação alimentar, baseada na ideia de que o álcool é um desinfetante. Embora seja verdade que o álcool pode matar bactérias e é usado para esterilizar superfícies, a eficácia dessa ação se limita ao uso externo, como na pele e em superfícies expostas.1 No caso do consumo de alimentos contaminados, o álcool ingerido não funciona da mesma maneira no interior do corpo, pois os patógenos já podem ter atravessado as barreiras naturais do sistema digestivo antes que o álcool possa inativá-los. Além disso, os efeitos do álcool dentro do organismo são muito mais complexos e podem, inclusive, comprometer o sistema imunológico em grandes quantidades, dificultando a recuperação.2
Alguns estudos pequenos sugerem que o álcool pode, em certas circunstâncias, proteger contra intoxicações alimentares, especialmente quando ingerido junto com alimentos contaminados. Um estudo realizado durante um surto de Salmonella na Espanha, por exemplo, indicou que aqueles que consumiram bebidas alcoólicas tiveram uma menor probabilidade de desenvolver sintomas de intoxicação alimentar em comparação com aqueles que não consumiram álcool.3 Outro estudo, realizado na Flórida em 1992, focou em um surto de hepatite A transmitida por ostras. Os pesquisadores descobriram que os participantes que consumiram bebidas alcoólicas com alto teor alcoólico (mais de 10%) tinham uma probabilidade significativamente menor de adoecer.4
Apesar dos resultados, esses estudos têm limitações importantes. A maioria das pesquisas que apoiam a ideia de que o álcool poderia reduzir o risco de intoxicação alimentar são observacionais e de pequena escala, o que significa que não podemos ter certeza de que o álcool foi o fator responsável pela proteção.
Fato é que o consumo excessivo pode enfraquecer o sistema imunológico, tornando o corpo mais suscetível a infecções. Estudos mostram que o uso crônico e excessivo de álcool reduz a eficácia das respostas imunológicas, diminuindo a capacidade do corpo de combater infecções bacterianas e virais.2,5 Além disso, o álcool pode causar desidratação, o que pode agravar os sintomas de intoxicação alimentar.
Embora existam algumas evidências de que o álcool pode oferecer proteção contra intoxicações alimentares em certas circunstâncias, confiar no álcool como uma medida preventiva não é recomendado. É muito mais eficaz adotar práticas seguras de manuseio de alimentos, como evitar a contaminação cruzada, cozinhar os alimentos a temperaturas adequadas, armazená-los de forma correta e não deixar alimentos perecíveis em temperatura ambiente por longos períodos. Quando for comer fora, ao escolher o estabelecimento, observe a limpeza do local, confira sua reputação e verifique se o estabelecimento possui licença sanitária e se as informações sobre os alimentos estão disponíveis. Essas estratégias são especialmente importantes para grupos vulneráveis, como crianças pequenas, idosos e pessoas com sistemas imunológicos comprometidos.
Assista a live com a participação dos psiquiatras Arthur Guerra, Camila Magalhães e Jairo Bouer.
Até que ponto o consumo de álcool pode ser considerado “social”? Quando ele se torna um problema?