Novo estudo mostra que dependentes de álcool que fumam têm mais dificuldade de parar de beber do que dependentes não-fumantes. Existem no mundo mais de 1 bilhão de usuários de tabaco, sendo que no Brasil, aproximadamente 9% da população adulta pode ser considerada dependente de nicotina, ocorrendo mais de 200.000 mortes por ano devido a problemas associados ao hábito de fumar. Um dos grupos considerados de alto risco para o consumo frequente e pesado de tabaco é composto pelos dependentes do álcool. A prevalência de uso de tabaco entre dependentes alcoólicos já chegou a ser estimada em 80%, e os riscos para a saúde de quem fuma e bebe simultaneamente parecem ser 50% maiores do que a soma dos riscos desses dois hábitos separadamente. Estudos indicam que a nicotina e o álcool atuam sinergeticamente, de tal forma que o consumo de tabaco pode aumentar os prazeres advindos do uso do álcool e esta substância, por sua vez, teria a propriedade de estimular o hábito de fumar. Dessa maneira, o uso de tabaco por dependentes de álcool é um fator de grande importância para a avaliação do tratamento da dependência alcoólica, tema abordado em um recente estudo publicado na revista Drug and Alcohol Dependence por pesquisadores do Programa Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas (PROGREA) da Faculdade de Medicina da USP. Nesse estudo, 155 pacientes do sexo masculino (103 fumantes e 52 não-fumantes) diagnosticados como dependentes alcoólicos foram avaliados, com o intuito de estabelecer se havia diferenças entre pacientes alcoolistas fumantes e não-fumantes com relação ao tratamento para a dependência do álcool. Os pacientes foram divididos em três grupos, segundo o tipo de medicamento utilizado durante o tratamento: topiramato, naltrexona e placebo (grupo-controle). Os pacientes foram avaliados durante 12 semanas, levando em conta os seguintes parâmetros: tempo decorrente até a primeira recaída, gravidade da dependência do álcool, aderência ao tratamento proposto e número de cigarros consumidos (esta última variável foi utilizada somente para pacientes alcoolistas fumantes). Os resultados apontaram que os pacientes alcoolistas fumantes apresentaram uma quantidade significativamente maior de consumo diário de álcool do que os não-fumantes. Ainda, os pacientes não-fumantes mostraram um maior tempo para a primeira recaída do que o grupo de fumantes (7,09 versus 5,42 dias, P<0,05). Com relação à aderência ao tratamento, 61,5% dos alcoolistas não-fumantes aderiram ao mesmo, enquanto uma menor proporção (51,4%) dos fumantes teve o mesmo comportamento. O estudo também evidenciou que o medicamento topiramato foi eficaz na redução do número de cigarros consumidos em comparação ao grupo-controle (com uma diferença média de 7,91 cigarros a menos/dia, P<0,01). O fato de o paciente ser fumante aumentou em 65% a chance de recaída para o uso de álcool, independentemente do tipo de medicamento prescrito, e não foram observadas diferenças significativas entre o grupo tratado com naltrexona e o grupo-controle. Por fim, os autores da pesquisa sugerem que o uso do topiramato parece ser uma alternativa adequada para o tratamento simultâneo de ambas as comorbidades (abuso de álcool e nicotina), já que dependentes alcoólicos que desejam parar de fumar, sem o auxílio de um tratamento farmacológico adequado, podem ter suas habilidades de lidar com a abstinência alcoólica prejudicadas pelos sintomas da ausência de nicotina. Em resumo, o presente estudo reforça a idéia de que os alcoolistas fumantes compõem um tipo específico de pacientes com dependência do álcool, possuindo uma manifestação mais grave da dependência e maior chance de uma recaída precoce durante o tratamento. Assim, sugere-se que os profissionais da área da saúde explorem maneiras de tratar essas duas comorbidades em conjunto, afim de que os resultados do tratamento da dependência do álcool e nicotina sejam mais efetivos.