A doença cardiovascular (DCV) é uma das principais causas de morte em todo o mundo (31% de todas as mortes mundiais) [1]. A influência de fatores de risco modificáveis, como tabagismo, hipertensão arterial, dislipidemia ou má alimentação, consumo de álcool etc., tem sido objeto de investigação desde a década de 1950. Importantes estudos mostraram que 90% dos infartos agudos do miocárdio, por exemplo, são atribuíveis a fatores de risco potencialmente reversíveis, tornando a redução dos fatores de risco DCV uma alta prioridade no mundo todo [1].
Recentemente, um estudo norte-americano examinou se haveria uma associação protetora do consumo moderado de álcool com o risco reduzido de doenças cardiovasculares (DCV) [2]. A pesquisa foi realizada em 908 homens, com idades entre 56 – 67 anos, livres de doenças cardiovasculares. Os participantes foram divididos em seis grupos: não bebedores, ex-bebedores e/ou bebedores muito leves (1-4 drinques nos últimos 14 dias), bebedores leves (5-14 drinques), bebedores moderados (15-28 drinques) e bebedores em risco (mais de 28 drinques). O estudo também avaliou outros fatores como status socioeconômico, apoio social, estado de saúde físico e mental, fatores na infância e história de uso indevido de álcool.
Os resultados deste estudo mostraram menor risco de DCV entre bebedores leves e moderados de álcool, em relação aos bebedores muito leves, independentemente de dados demográficos, tamanho corporal e comportamentos relacionados à saúde. E, embora este estudo observacional não aborde a causa, os resultados mostraram que homens de meia-idade que consomem álcool com moderação têm menor risco de DCV e melhor saúde cardiometabólica do que homens que consomem pouco ou nenhum álcool, independentemente de uma variedade de fatores de saúde, comportamentais, psicossociais e fatores de vida anteriores.
Os autores reiteram que nos resultados apresentados há uma associação protetora do consumo leve e moderado de álcool com o risco reduzido de DCV. Contudo, é importante ressaltar que existem vários hábitos saudáveis e mecanismos biológicos que podem estar associados a este fator de proteção.
O possível efeito protetor do etanol ainda não é compreendido; estudos têm reforçado o efeito protetor de outros compostos encontrados em bebidas alcoólicas, como os polifenóis no vinho, por exemplo [3]. Porém, o presente estudo não relata se as associações diferem por tipo de bebida: os participantes da pesquisa consumiam preferencialmente cerveja, com relativamente poucos bebedores que consumiam preferencialmente vinho ou licores. Dessa forma, seria importante investigar se outros compostos da cerveja poderiam contribuir para os aspectos cardiometabólicos da proteção de risco de DCV.
Outra limitação na pesquisa se refere à amostra: exclusivamente composta por homens brancos (91%). A prevalência do uso de álcool foi de 64% e apenas 6% eram abstêmios. O estudo também não controlou diferenças no padrão de ingestão de álcool como a frequência de consumo, beber durante as refeições, beber sozinho etc., que podem afetar as associações encontradas nos resultados.
Embora o consumo moderado de álcool esteja aparentemente associado ao risco reduzido de DCV, muitos outros fatores podem estar envolvidos na manutenção da saúde cardiovascular, ligados ao estilo de vida, status socioeconômico e fatores genéticos. De qualquer forma, não se pode deixar de considerar que o álcool é fator de risco para mais de 200 tipos de transtornos e agravos [4]; por conta disso, a substância não deve ser tratada como um “remédio” ou utilizada para prevenir qualquer tipo de doença.
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