A dependência de álcool é uma doença crônica e multifatorial; diversos fatores contribuem para o seu desenvolvimento, incluindo a quantidade e frequência de uso do álcool, a condição de saúde do indivíduo e fatores genéticos, psicossociais e ambientais. Ao compararmos o alcoolismo com outras doenças crônicas, as opções de medicamentos para tratamento são limitadas.
Um artigo publicado em setembro de 2022 aponta a espironolactona como uma alternativa para o tratamento de transtornos por uso de álcool1. A espironolactona é um remédio diurético (aumenta a eliminação de água através da urina) e anti-hipertensivo (diminui a pressão arterial) indicado para controlar a hipertensão arterial (pressão alta), tratar distúrbios edematosos (relacionados a inchaço), hiperaldosteronismo primário (superprodução do hormônio aldosterona) e hipocalemia (redução do nível de potássio no sangue). A espironolactona inibe competitivamente a aldosterona, hormônio produzido pela glândula adrenal nos rins, levando à excreção de sódio e água e à retenção de potássio.
O estudo referido foi conduzido primeiramente em roedores, onde os pesquisadores perceberam que o uso da espironolactona reduziu o consumo compulsivo de soluções alcoólicas adoçadas e não adoçadas em camundongos, sem alterar o consumo de comida ou água pelos roedores e nem feito adverso na função motora e coordenação. O próximo passo da investigação foi a realização de uma revisão retrospectiva dos prontuários dos soldados no sistema de saúde dos veteranos de guerra dos Estados Unidos. O objetivo foi avaliar a hipótese de que a espironolactona poderia ter reduzido o uso de álcool em pacientes que utilizavam essa medicação prescrita para outros problemas clínicos. Os prontuários avaliados foram de pacientes que apresentavam um consumo de álcool antes do tratamento clínico e a análise indicou uma redução do consumo de álcool por esses indivíduos. Os maiores efeitos ocorreram entre aquelas que relataram beber pesado episódico ou consumo de risco e aqueles expostos a mais de 50 mg/dia de espironolactona.
O mecanismo pelo qual a espironolactona reduz o consumo de álcool está ainda em investigação. Há hipóteses indicando que os níveis elevados de aldosterona (hormônio inibido pela espironolactona) circulante podem contribuir para o aumento do consumo de álcool através do aumento de ansiedade, facilitando a ativação do sistema de estresse cerebral e/ou induzindo a neuroinflamação2. Para entender mais sobre a associação entre ansiedade e aumento de consumo de álcool, veja nosso texto sobre como “Beber para lidar com emoções negativas é sinal de alerta”.
A dependência de álcool é uma doença crônica e heterogênea, isso significa que diversos fatores contribuem para o seu desenvolvimento, a quantidade e frequência de uso do álcool, a condição de saúde do individuo e fatores genéticos, psicossociais e ambientais. Assim, é importante classificar potenciais biomarcadores de eficácia correlacionado a espironolactona em vários grupos de pacientes. Para consolidar estes dados iniciais apresentados pela pesquisa, os autores apontam que são necessários mais estudos a respeito da espironolactona no tratamento dos transtornos por uso de álcool.