Após os 60 anos, é comum o surgimento de diversas doenças decorrente da idade, como diabetes, osteoporose, problemas cardiovasculares, colesterol elevado, entre outros. Entretanto, as complicações podem aumentar se a pessoa consumir álcool em excesso. O psiquiatra e presidente executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), Dr. Arthur Guerra de Andrade explica os riscos do alcoolismo na terceira idade e como pode ser perigoso a interação com outros medicamentos:
Quais são os riscos do alcoolismo na terceira idade, principalmente para homens?
Transtornos por uso de álcool em idosos são comuns. Com isso eles podem desenvolver quadros de depressão, irritabilidade, confusão mental. Além disso, podem apresentar deficiências nutricionais associadas ao uso crônico de álcool, que pode levar a quadros neurológicos e demenciais; alterações para o risco cardiovascular (infarto do miocárdio e acidentes vasculares cerebrais), que já é maior com o avançar da idade e outros fatores de risco que também pioram com o alcoolismo, como diabetes e hipertensão arterial.
Há também o risco de óbito em determinadas condições, chamado de delirium; alterações hepáticas, considerando que o fígado de um idoso com história de uso crônico de álcool pode ter sua função alterada em diferentes níveis, inclusive com possível instalação de cirrose e insuficiência hepática; surgimento de alguns tipos de câncer e alterações do sistema imunológico, que já são mais comuns em idosos. Com relação ao risco de quedas, pode representar um transtorno muito difícil dependendo da magnitude da lesão e capacidade de recuperação, muitas vezes levando a cirurgias ortopédicas com necessidade de colocação de próteses riscos relacionados ao período de imobilização e hospitalização.
O avançar da idade interfere na sensibilidade ao álcool?
Nos idosos, percebe-se um aumento na sensibilidade ao álcool, já que o envelhecimento pode diminuir a tolerância do corpo para esta substância com as mudanças no organismo, como capacidade de metabolização hepática e função renal, além de mudanças da composição corporal, com maior tendência a desidratação. A ingestão de álcool em idosos pode provocar efeitos mais acentuados comparativamente aos jovens de mesmo sexo e peso.
O consumo de álcool em excesso pode aumentar os riscos de câncer?
O álcool é um depressor do Sistema Nervoso Central e age diretamente em diversos órgãos. O seu consumo tem sido identificado como fator de risco para câncer de boca, nasofaringe, faringe, orofaringe, laringe, esôfago, colorretal, fígado e pâncreas. Quanto maior o consumo, maior será o risco para desenvolver a doença.
Geralmente, os idosos tomam diversos medicamentos. O álcool pode alterar o efeito ou causar algum problema por isso?
Mais de 100 medicamentos interagem com o álcool, e é fundamental ressaltar que isso não é restrito a uma determinada classe de fármacos. Alguns desses medicamentos são utilizados para o tratamento de problemas cardíacos, enquanto outros para diabetes, ou depressão – são fármacos que diferem entre si, mas que na maioria das vezes interagem com o álcool de alguma forma. O álcool pode interferir nos efeitos de medicamentos ou vice-versa; pode ocorrer redução da eficácia de um remédio ou intensificar seus efeitos. Ademais, também pode causar efeitos secundários como náusea, vômito, cefaléia e vertigem.O uso concomitante de álcool com outros depressores do sistema nervoso central (tranquilizantes, anti-histamínicos, ansiolíticos, analgésicos, antidepressivos) faz com que certos efeitos sejam exacerbados, como sedação, sonolência, perda de coordenação motora e de memória. Isso expõe o indivíduo idoso a maior risco de queda, acidentes, intoxicação e até mesmo morte. Vale lembrar que alguns medicamentos são compostos por diferentes substâncias – às vezes, mais de um deles pode reagir com o álcool. Além disso, mesmo se não forem ingeridos ao mesmo tempo, é possível ocorrer interação, pois alguns remédios demoram para ser absorvidos ou seus efeitos são prolongados.
Os idosos têm mais dificuldade para se livrar do alcoolismo?
Os estudos mostram que os idosos se beneficiam dos tratamentos contra a dependência de álcool do mesmo modo que as pessoas mais jovens. Contudo, a efetividade dos tratamentos tende a ser melhor para aqueles que apresentam menor histórico de uso problemático de álcool. Vale ressaltar que a família é peça-chave tanto na prevenção do uso nocivo do álcool, como em casos em que o problema já está instalado. Inclusive, não são poucas as vezes em que o tratamento se inicia pela família, principalmente porque o usuário de álcool não aceita seu problema, não reconhece que o uso de bebidas alcoólicas lhe traz consequências negativas ou está desmotivado para buscar ajuda. Além disso, a família pode auxiliar na aderência, permanência, na superação de dificuldades decorrentes do processo e no estabelecimento de um novo estilo de vida sem o uso do álcool. Também pode ajudar a equipe multidisciplinar identificando mudanças comportamentais abruptas (por exemplo: isolamento, irritabilidade, labilidade do humor, prejuízo no desempenho do trabalho), que possam ser indicativos de complicações ou possíveis recaídas, as quais muitas vezes podem ser evitadas. Ainda, um acompanhamento por profissionais da saúde, específico e dirigido para os familiares, é essencial para que possam compreender a doença e seus desdobramentos e, posteriormente, receber orientação adequada sobre a melhor forma de ajudar o ente querido e a si mesmo.